quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Improvisação livre aqui agora

Que 2012 está um ano incrível para a improvisação livre no Brasil não há dúvida: já aportaram por aqui Peter Brötzmann, Roger Turner, David Torn, entre vários outros, e está marcada para setembro a vinda do Instant Composers Pool, de Han Bennink e Misha Mengelberg.

Mas esse bom momento não se deve somente às visitas ilustres. Destaco aqui três grupos brasileiros que vem fazendo bonito na área da free music:

Coletivo Abaetetuba

Tive a oportunidade de assisti-los duas vezes neste ano: com Roger Turner e Urs Leimgruber (falei sobre esse show aqui) e no Festival de Cinema Silencioso, no qual fizeram a trilha sonora para o filme alemão Sombras. Com uma formação que inclui uma rabeca, um shamisen e diversos objetos que usualmente não são utilizados para fazer música (pás de batedeira, sacos plásticos), o coletivo tem uma linguagem bastante radical, distante, inclusive, do free jazz.



Mnemosine 5

O Mnemosine 5, grupo que lançou o primeiro disco em 2012, embora também seja experimental (a improvisação livre SEMPRE é experimental), trabalha com músicas com contornos mais definidos e tem até uma pegada roqueira.



Chinese Cookie Poets

Falando em pegada roqueira, outra ótima descoberta de 2012 foi o grupo carioca Chinese Cookie Poets. A banda já havia lançado dois EPs e neste ano saiu o primeiro álbum, Worm Love - dá para ouvi-lo todinho no Bandcamp dos caras. E eles se apresentam no CCSP dia 13 de setembro, às 21h.





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segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Música versus realidade

Aviso: o texto que você está prestes a ler é um devaneio - se não curte, tchau.

Como toda pessoa apaixonada por música (e como todo mundo que foi educado por meio do cinema e de séries de TV, sejamos francos), tenho carinho pela ideia de trilha sonora da vida: ligar paixões, fossas, alegrias, tristezas a determinadas músicas. Para isso, nada melhor do que canções - e pode entrar aí o pop mais sem vergonha, baladas corta-pulso, "Wicked Game"...

Por outro lado, cada vez mais me sinto atraída por músicas impossíveis de serem relacionadas a qualquer coisa que não elas mesmas - e diria que 90% do conteúdo deste blog trata justamente desse tipo de linguagem. São músicas que parecem inclusive existir em um tempo diferente do tempo do relógio, que não servem para preencher os momentos da vida com sons e sim para arrancar o ouvinte dessa coisa que chamamos realidade. Das músicas estilo "trilha sonora da vida" posso extrair um grande prazer momentâneo, mas transcendência mesmo só consegui com as do segundo tipo.

Mas deixemos o umbigo um pouco de lado. A ideia de música como algo que não faz parte do mundo cotidiano não brotou agora da minha cabeça. O futurista Luigi Russolo, no manifesto L'arte dei rumori (A arte dos ruídos), de 1913, defendia que:

Entre os povos primitivos, o som era atribuído aos deuses. Era considerado sagrado e reservado aos sacerdotes, que o utilizavam para enriquecer seus sitos com mistério. Assim nasceu a ideia do som como algo em si mesmo, diferente e independente da vida. E disso resultou a música, um mundo fantástico sobreposto sobre o real, um mundo inviolável e sagrado.

O mesmo pensamento aparece de vez em quando em entrevistas com artistas que admiro. Por exemplo:

Dimitri, uma das vozes guturais por trás do insano Phurpa (banda russa de música tibetana), afirmou, em entrevista ao Intervalo Banger, que a música do grupo não tem qualquer emoção ou "elo com a realidade do cotidiano".



Em entrevista ao site Pitchfork que acabou de ir ao ar, Michael Gira não chegou a ser tão explícito, mas disse que curte guitarras com volume alto porque gosta de "como você pode perder todo seu ser no som".



E mesmo na conversa que tive com Flo Menezes ele ressaltou que "Com a maioria das peças em que você se confronta com uma complexidade que te absorve, a tendência é abstrair o tempo. E quando você abstrai o tempo você vai para uma dimensão onírica".




terça-feira, 14 de agosto de 2012

Trey Spruance assopra velinhas

Link
Sabe aquela história de "fulano é um grande sujeito, tanto no profissional quanto no pessoal"? No caso de Trey Spruance essa frase besta faz todo o sentido: além de ter tocado guitarra no Mr. Bungle e no Faith no More e de atualmente comandar o Secret Chiefs 3, o cara é gente fina como vi poucas vezes na vida.

Tive oportunidade de entrevistá-lo para a Soma em abril, quando o SC3 veio tocar em São Paulo, e foi um dos papos mais legais da minha jovem carreira de jornalêra. Generosíssimo, ele topou passar mais de uma hora conversando (detalhe: tanto Spruance como os outros caras da banda, também super bacanas, estavam morrendo de fome) e depois ainda nos falamos no meio virtual para ele esclarecer alguns pontos. E quando a matéria foi ao ar, ele ainda elogiou e tal. Enfim, o entrevistado dos sonhos!

Para comemorar a data em grande estilo, posto aqui dois shows completos:

Mr. Bungle tocando no Bizarre Festival em 2000(aliás, o único registro audiovisual decente da banda):




Secret Chiefs 3 participando do show do John Zorn no Jazz em Marciac deste ano:

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

MuCoMuFo 5 - Meredith Monk

Apesar de meio deixado de lado, meu movimento Mulheres Contra a Música Fofinha, aka MuCoMuFo, continua vivo e chutando. A fodona da vez é a compositora e cantora Meredith Monk, que, ao contrário das outras mulheres que apareceram nessa seção, não faz o estilo "dois pés no peito". Pelo contrário, a radicalidade dela está no outro extremo, o extremo da delicadeza:



Muito influenciada por zen-budismo, Monk lançou discos com nomes como Impermanence e Mercy e em sua música é impossível encontrar qualquer coisa que lembre raiva, ódio, desespero - assim como não há grandes exaltações ou felicidade efusiva, apenas uma serena alegria de viver.

Monk, que também já fez incursões pela videoarte, se preocupa bastante com o aspecto visual das suas apresentações (os cantores costumam realizar pequenas coreografias, inclusive). Nesse vídeo, a própria arquitetura do local foi utilizada para criar um contexto visual para a música. Belíssimo:





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